Macumba

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sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Judgment Day


 

  Grito Ateniense por Apocalipse

Quando a Terra é avistada da Lua, não são visíveis, nela, as divisões em nações ou Estados. Isso pode ser, de fato, o símbolo da mitologia futura.”[1]

 

1.   Introdução.

2.   Atená Versus Curupira.

3.   Constituição em Desespero.

4.   Mitologia da Submissão ou Apocalipse.

5.   Conclusão.

 

1.   Introdução

 A sociedade nunca esteve tão conectada de maneira que a era da comunicação sonhada por muitos em meados do século XX chegou com toda força.

Porém não como o esperado, pois ainda que o planeta não esteja mergulhado em guerras como ocorreu ao longo dos últimos milênios estamos envoltos nos piores sentimentos catalogáveis: vontade de deixar de existir, raiva de tudo e todos com acusações bulyanas de péssimo gosto, em suma um certo sabor que força superior só nos mantém vivo por algum interesse sórdido ou escravista.

Ou em linhas gerais, viver nesse planeta é o verdadeiro inferno bíblico, algum tipo de punição pelo que teríamos feito, mas esquecido; ou alguma sacanagem engendrada por forças mais elevadas do que a que temos contato em nosso cotidiano.

Certo é que para o bem ou para mal, nesse início do século XXI a humanidade chegou a um “portal”, o global. Ainda que ao longo do século passado tenhamos chegado perto de nos unificar como linguagem planetária em razão de avanços tecnológicos, como comunicação por satélite, viagens de avião, adoção do vocabulário inglês como internacional e claro a criação da ONU; tal marco não foi alcançado.

Somente com a suposta pandemia do Coronavirus que passamos a agir em parâmetros mitológicos como povo único do planeta. Nada importa se essa suposta pandemia é fraude, sendo a OMS uma entidade internacional dirigida por estelionatários ou se a mídia aloprada assoprou o terror do vírus chinês agindo como autêntica rede de prostituição tão profissional quanto o mais sofisticado puteiro de Roma. Mesmo assim, o fato é que todos países responderam a essa crise como povo do Planeta. Isso nunca aconteceu antes e jamais seremos os mesmos diante das experiências que compartilhamos.

Daí nunca foi tão importante refletir como agiremos daqui para frente, pois o parâmetro mudou, não haverá espaço para voltarmos ao cotidiano de antes dessa suposta pandemia, não pelas questões médicas ou sanitárias, sim por conta da unidade de reflexões e consequentemente de padronização nas respostas institucionais ao longo de 2020. Ou aprendemos a lidar com essa nova realidade ou muitos serão dragados por ela donde os sentimos de raiva comuns atualmente tenderão ao longo dos próximos anos a tornar nosso cotidiano mais insuportável ainda do que já está diante das acusações gratuitas e das reclamações ignoradas a que já infelizmente nos acostumamos, notadamente em redes sociais pela internet.

 

2.   Atená Versus Curupira.

Faremos uma revolucionária comparação de uma personagem mitológica grega e uma entidade mitológica indígena brasileira em ordem a transparecer e situar “cosmicamente” a importância do mito de inversão.

“Os Mitos de inversão guardam a função de constelar, na fantasia humana, uma imagem de “vingança” para a híbris (excesso agressivo) humana que fundou a cultura” Mitos, Folias e Vivências. Isabela Fernandes. Editora Bapera, página 55.

Desde já fica clara a natureza fundamental do personagem de inversão pois ele é o elo atemporal entre acontecimentos passados e futuros. Ou seja, através do conhecimento da dinâmica da entidade descobrimos a real importância dos fatos mesmo quando nos deparamos com estórias decaídas tais como as causadas mediante reação em cadeia[2].

Então, temos em Atená a filha que toma o poder do reinado principalmente do seu Pai, Zeus, num cenário de mundo alquímico, a civilização grega. Já no caso de Curupira temos a entidade que toma[3] o caminho do caçador o qual afeta o cenário de sua tribo quando não respeita a caça ou quando legitimamente necessita de auxílio, porém num ambiente sem alquimia notadamente as matas brasileiras.

Atená é a figura responsável pela institucionalização da pólis, através do senso de julgamento. Lado outro Curupira também assume essa responsabilidade de garantir integridade institucional, porém de forma ilimitada sempre atrelada aos instintos humanos naturais. Enquanto Atená apela a um suposto senso de razão para separar o adequado do inadequado, Curupira age com pura simplicidade impondo seu critério sem uma análise laboratorial.

Evidente que a institucionalização promovida por Atená não poderia afastar o princípio do auditório onde a vontade de maioria deve prevalecer face a minoria em algumas questões como o julgamento criminal, porém Curupira não apela jamais ao certo ou errado, ao incluso ou ao banido, ao normal ou ao grotesco, sua preocupação como entidade protetora das matas é manter um equilíbrio entre protagonistas e cenário mais precisamente entre tribo e floresta.

Adentrando na psicologia analítica Atená define uma particularidade em relação ao Curupira: a necessidade de afirmar que se a anima confrontar o animus aquela levará a melhor, ou seja, como a mulher é a casa e o homem o invasor dela no que tange ao sexo então cabe a mulher decidir quem a invadirá. E ainda, o poder de esconder quem a invadiu, como exemplo engravidando do amante, mas atribuindo a paternidade ao marido.

E, é por isso que Hesíodo separa homens e mulheres como duas faces da mesma moeda e atribui ao homem a face normal e à mulher a face malévola. Aqui mesmo sem intenção Hesíodo está atribuindo a mulher super poderes perante o homem e concomitantemente instituindo a importância da prole especialmente ao casal:

“E assim também Zeus, que estrondeia nas alturas, enviou aos homens mortais um mal maior: criou as mulheres, que se ocupam em obras malévolas.” Teogonia. Verso 600.

Nas tribos indígenas brasileiras não é a regra casais rígidos ou duradouros bem como a passagem de herança. Daí pouco importa se a mulher vai “chifrar” o homem, ao contrário da mitologia grega onde mesmo quando o chifre é consentido pelo marido ele acaba por pesar na cabeça do “dono”. Numa tribo onde o mito de inversão é Curupira cujo androginismo protege as zonas fronteiriças não há porque chamar um homem de chifrudo.

Aqui vale diferenciar a hibris indígena brasileira da hibrys européia:

“Nada de novo pode surgir se não vier acompanhado de uma hibris. No Mito do Gênesis a hibris do casal resultou na expulsão do paraíso, porém o homem adquiriu um conhecimento divino que possibilitou sua emancipação em relação a deus...”. A vida, a Morte e as Paixões no Mundo Antigo. Isabela Fernandes. Editora Cassará. Página 112.

Na mesma linha o famoso mito de Pandora onde mesmo advertida a não abrir o vaso[4] ainda assim ela ultrapassou a recomendação e todos caíram nas desgraças dos males.

Porém, interessante saber é se existe algum efetivo avanço na citada emancipação divina? As circunstâncias laboratoriais onde é possível a razão crivar o julgamento do certo ou errado, do incluso ou do banido é realmente superior como preleciona a mitologia grega? Ou certeira seria a mitologia do Curupira que se limita tão somente a avaliar equilíbrio entre mata e tribo?

  Como Atená é a deusa que instituiu a pólis, encampando inclusive a liderança de Zeus, nessa simbologia ela virou o mito de inversão do povo europeu significando ao velho continente que Família é relevante e dentro dela se não houver respeito especial a mãe por todos seus integrantes ela esculhambará o pai e todos sofrerão as consequências.

Já no caso do Curupira não existe essa guerra entre sexos. Sua atividade não envolve qualquer artimanha sexualizada ao contrário de Atená. Nem tão pouco faz diferença o sexo de suas “vítimas” somente lhe interessando eventual perturbação que possam causar aos animais da mata. O excesso agressivo do caçador é configurado, porém vingança a ele é individualizada, ao contrário da polis onde o plano vingativo envolve outras pessoas, notadamente num cenário alquímico em que o réu é tratado como rato num laboratório farmacêutico.

Essa perspectiva sombria é mais uma experiência com intuito de lucro que efetivo procedimento investigativo, ao contrário do julgamento do Curupira face a hibris do caçador onde os danos são contidos mantidas as atitudes individuais.

Não é à toa nos julgamentos sociais o sentimento de manada sempre prevalece. Sócrates que o diga, só para lembrar o mais emblemático caso da própria Grécia. Provavelmente o máximo de “julgamento[5]” que a espécie humana está apta a fazer é o eleitoral, dado ser competitivo pela opção entre candidatos; e dado ser feito em perspectiva em razão do candidato ser julgado pelo seu passado, mas para servir ao futuro.

O julgamento eleitoral afasta a problemática do mito de Prometeu e Epimeteu[6] na medida em que o tempo não é cindido. Ou seja, numa eleição todos estão bem posicionados no que tange a responder os estímulos do ambiente. É que se escolhe um candidato e depois pode-se tirá-lo, através de medidas como impeachment no presidencialismo ou no parlamentarismo pelo voto de desconfiança.

Já no julgamento criminal prevalece o sentimento protetivo de ovelha numa manada, pois os jurados agem como Prometeu ou Epimeteu, nunca tendo a visão do todo. Ou os jurados se identificam com questões motivacionais da percepção do julgado e o absolvem, ou ignoram essa percepção e o condenam. Infelizmente é simples assim que funciona qualquer julgamento criminal no Planeta. É que se o jurado olha para frente e aí se identifica que a acusação contra o réu pode vir a ser aposta a si então o absolve. Já se o jurado não vislumbrar que acusação equivalente poderia um dia cair contra si então condena o réu, pouco importando o afeto a eventual vítima, em qualquer caso.

Fraqueza humana ou não. O fato é que a humanidade não sabe, quiçá não possa, julgar seu semelhante, mesmo num ambiente institucionalmente criado para isso como os tribunais. E isso pode ser ilustrado pela comparação entre Atená e Curupira, sendo a primeira deusa da justiça e sabedoria, mas institucionalizando uma cidade que ficou famosa pelos julgamentos arbitrários. Já Curupira nunca se apresentou como salvação de nada, no entanto seus julgamentos sobre auxiliar ou sabotar caçadores é por todos respeitado mesmo mediante um critério que não pode ser quantificado ou racionalizado:

“O Curupira é uma máscara híbrida e demoníaca, um rosto sagrado de várias faces. Ele pode ser o ogro devorador, mas também é um guia espiritual de ritos de passagem.” Mitos, Folias e Vivências. Isabela Fernandes. Página 45.

Todos esses elementos intuitivos convergem que o detentor de tecnologia, no caso Atená, tem uma ferramenta mais versátil do que aquele que não aplica alquimia, no caso Curupira. Mas quanto mais sofisticada é a ferramenta maior a possibilidade de seu detentor se tornar opressor. Atená além de ser tida como questionável deusa virgem ainda é sempre relacionada como a herdeira de Zeus, circunstâncias que elaboram a ideia de passagem de herança, tanto pela necessidade de algum namorado receber do pai a menina supostamente intocada quanto pela importância de integrar uma família composta de patrono com posses.

Em palavras analíticas, tanto a introversão quanto a extroversão de Atená se ocupam a influenciar figuras masculinas, seja seu pai ou namorados, ora utilizando a herança como elemento objetivo ora utilizando o ventre como elemento subjetivo.

No entanto a mitologia grega nunca questionou esse lado trikster ou malandro de Atená ou como diriam hoje feminazi[7] porque seu personagem se encaixava com a cultura da época, conforme referência a Hesíodo citada. Somente 2500 após a literatura passou a questionar esse modelo cultural dominantemente ocidental:

“Podemos notar que o elemento da realidade trazido por uma mulher equilibrada não é representado na deusa ou em uma figura ideal como a Virgem Maria. Juntar todos esses aspectos paradoxais do feminino e saber como relacioná-los, é uma das grandes dificuldades.” Animus e Anima nos Contos de Fadas. Marie-Louise Von Franz. Editora Verus. Página 79.

Já Curupira não perde seu tempo se dedicando a convencer o sexo oposto, ou o próprio se é que ele se identifica.

Só nos resta concluir que o mundo alquímico é uma realidade que nos permite modificar a natureza muito além da realidade do Curupira. No entanto, se essa modificação causada na mata do personagem indígena tornar a realidade cega no equilíbrio entre civilização e Planeta de nada terá servido a suposta emancipação divina.

 

3.   Constituição em Desespero

A Constituição de 88 tem três problemas fundamentais os quais garantem meios de persistência ao que deveria combater. É que a lei de um país deve ser instrumento do povo para o povo. E a Constituição de 88 é documento destinado ao stablishment, ou seja, a Carta da Assembleia Constituinte é uma fraude pois cria instituições caras, em excesso e sem sistema de freio e contrapesos, os quais ao invés de tornarem a vida do “bonde do stablishment” um pesadelo faz o contrário lhes oferece o paraíso.

Os três problemas fundamentais estão no sistema criminal onde se hipertrofia a acusação e se atrofia a defesa; no judiciário onde se cria um carreirismo caro e corporativista; e no geral em várias instituições como tribunais de contas, legislativos, procuradorias jurídicas e depois de 88 ainda criaram agência reguladoras ineficientes onde a título de se dar autonomia funcional a esses órgãos inventaram verdadeiros monstros devoradores que servem mais a perversão do stablishment do que ao povo.

No que tange ao segundo e terceiro problemas não há muito mais a ser dito.

No caso do judiciário, a carreira de juiz só se compatibiliza sistemicamente com o stablishment. É que um judiciário a servir ao povo deve ter mandato para juiz e não profissão de juiz. No Brasil quando se diz que a carreira de alguém é juiz o lance desanda, o cara só pensa no status governamental, pelo que servir ao povo quando muito vira tarefa secundária.

Mudar isso não é difícil, só alterar a Constituição mantendo o funcionamento dos tribunais de julgamento com seus servidores e toda sua estrutura somente excluindo a carreira de juiz e a trocando por mandato ao máximo 04 anos, daí criando meio de escolha permanente vindo de órgãos da sociedade civil, de governantes, de integrantes dos próprios tribunais, por eleição e de servidores de outros órgãos públicos, por indicação.

É um meio rápido, simples e eficiente de tornar o judiciário brasileiro sério e eficiente cujo o único obstáculo seria o corporativismo dos juízes atuais e dos beneficiários do stablishment, notadamente no congresso.

Quanto às autonomias de vários órgãos os tornando caros e ineficientes a saída é extinção de alguns e restruturação de outros, mas voltamos ao problema anterior, vontade do congresso.

A problemática mais profunda que envolve a mitologia tratada no capítulo anterior está no sistema criminal. A Constituição de 88 agravou a problemática já existe existente na maior parte dos países quanto ao julgamento criminal exposta pelo mito Prometeu/Epimeteu. É que no Brasil além da cegueira de um dos olhos exposta pelo mito citado quanto a súmula do júri se identificar ou não com a percepção do réu, a nossa “querida” Constituição de 88 ainda criou outra cisão no julgamento social: transformou a acusação num estorvo que se senta ao lado do juiz ao invés de ficar de frente para a defesa. Só existe paralelo ao que acontece no Brasil nos piores eventos medievais quando a igreja perseguiu cidadãos para compatibilizar a cultura europeia as suas próprias doutrinas.

A cisão criada pela Constituição de 88 faz com que o stablishment seja alçado ao nível de política pública. Ou seja, o cidadão deve se compatibilizar com o pensamento do governo ou sofrer as consequências. É inacreditável o nível de arrogância que nossa Constituição franqueia ao prestador de serviço público no Brasil.

Todo o sistema criminal é treinado para ser uma engrenagem do governo desde que para os próprios interesses da máquina pública, e atacando todos aqueles que levantam a bola que o salário dos servidores públicos é pago com dinheiro de impostos os quais são recebidos impositivamente, ao contrário do compromisso do empresariado de prestar um bom serviço para produzir renda.

Certo é que regulação é atividade estatal, mas deve ser feita com motivação e prestação de contas, jamais como é “cuspida” atualmente num varrimento de cima para baixo sob pena do cidadão questionador sofrer ataques absurdos quando contestação legítima for aposta expondo a “porcalhada” dos agentes do stablishment.

Apesar do título desse capítulo “Em Desespero” não é a Constituição vigente que está gritando, são os deputados que a fizeram em 88. Inventaram no papel um país inexistente na medida que promete bons serviços básicos a todos. Ou seja, pintando o pleno sem entregar ao “povão”; e dando o que não deveria ao bonde de ladrões do colarinho branco do stablishment, sejam aos cargos eleitorais, cargos em comissão ou cooptando os concursados.

Em suma, superadas as lorotas do papel que não existem na realidade o maior fardo do brasileiro outsider stablishment é a carga tributária altíssima sem correspondência com o dever da boa prestação de serviços cuja válvula ladra escoa a verba para pagar salários e outras benesses inadequadas a estrutura governamental.

É impressionante que o país não tenha se afundado numa guerra civil ou miséria grotesca pelas ruas. No abraço do afogado, o desespero faz com que o náufrago se agarre ao salvador e ambos morram.

Se não derem cabo da ideologia que sustenta a Constituição de 88 logo não passará uma década os impostos para pagar folha salarial do serviço público impedirão a livre economia no país. A fome vampiresca dos ladrões do stablishment os torna cegos na questão orçamentária. Daí, no depender deles sugarão toda a vitalidade da iniciativa privada da mesma maneira que o abraço do afogado: o stablishment se agarrará ao produtor de renda e o levará ao afogamento se esse insistir em tentar salvar aquele.

A única salvação para o salva vidas brasileiro é abandonar o náufrago a sua própria sorte, ou seja, tornar o serviço público enxuto e a partir daí exigir que toda manifestação de servidor público seja motivada de acordo com os anseios gerais da nação.

 

4.   Mitologia da Submissão ou Apocalipse.

Abordagem mais profunda do texto é averiguar conselho comum da sociedade brasileira no sentido que os dois meios para “sucesso” no Brasil são roubando ou enganando, opção a ser feita quando não for possível empreender os dois ao mesmo tempo.

Pois bem, como encaixar esse life style de boa parte dos brasileiros em um panorama mitológico? Simples por uma resposta superficial, mas complexo para quem efetivamente pretender enfrentar a mecânica desse pensamento que de tão enraizado na cultura brasileira virou verdadeiro estilo de vida. É que aprofundando a diferença entre o modelo tribal do Curupira e o modelo civilizatório de Atená nos deparamos com os mitos criacionistas.

Os chamados “mitos de criação” são aqueles em que o enredo principal é narrar os vínculos mais básicos de uma sociedade. Como na mitologia não há a imprescindibilidade da demonstração laboratorial científica, tais mitos focam não na gênesis em si mas nos resultados mais imediatos de sua ocorrência.

“Nos mitos de criação, o nascimento dos filhos e netos dos pais primordiais configura uma transgressão da ordem familiar arcaica. Por isso, em quase todas as cosmogonias das grandes civilizações, cria-se o cenário simbólico de um conflito entre as gerações, muitas vezes tomando a forma de uma guerra cósmica entre pais e filhos.” A Alma Brasileira. Luzes e Sombra. Isabela Fernandes. Editora Vozes. Página 227.

A Mitóloga está se referindo a regra geral das cosmogonias europeias. Porém tal construção é ocorrente em todas culturas em que há tecnologia, possivelmente porque nesses locais as pessoas se acostumam com situações mais estáveis como trabalhar num moderno prédio ou morar numa casa com estrutura exagerada e a partir dessa sensação de segurança acaba-se gerando uma crise de confiança.

Um modelo um tanto excepcional a esse conflito familiar das civilizações tecnológicas é a China. Mas lá uma doutrina filosófica existencial acabou por trilhar caminhos protetivos a dependência da tecnologia. De fato, o I Ching tem como premissa que não existem coisas, eventos, situações ou qualquer possibilidade do ser humano estar completamente seguro.

Esse anseio por estabilidade acabou prevalecendo em quase todas civilizações tecnológicas com exceção da China pelo forte valor cultural do I Ching:

“O princípio no qual se baseia o I Ching encontra-se em profunda contradição com a concepção do mundo ocidental, científica e teleológica. Em outras palavras, ele é extremamente anticientífico e, arriscaria até dizer, proibido, uma vez que é incompreensível e foge ao nosso juízo científico. O Segredo da Flor de Ouro. Um Livro de Vida Chinês. Jung e Wihelm. Editora Vozes. Página 13.

O fato é que o I Ching é um panorama de interação homem face armadilhas sistêmicas pelo que apresenta esquemas que visam protege-lo da tecnologia, assim como a pátria Mandarim construiu a famosa muralha para proteger o chinês do estrangeiro.

Ao que parece a China desde seus primórdios intuiu o que o Mitólogo Joseph Campbell expôs em sua famosa e longa entrevista ao seu amigo jornalista, O Poder do Mito: a tecnologia tem algo que sugere vontade, ou seja, ela parece apresentar certo grau do que se convencionou chamar de consciência. Campbell ainda manifestou certo espanto por “sentir” que os primeiros computadores pessoais pareciam ter certa vida própria.

A China parece ter sido a primeira cultura que a nível institucional criou uma “doutrina” com a pretensão de proteger o homem das armadilhas no uso da tecnologia. E, apesar de seu excelente pioneirismo não foi seguida pela cultura geral do ocidente, a qual até hoje não se deu conta da possibilidade tecnológica em ocultar algum esquema nocivo ao homem. E essa habilidade ou atribuição não é a espionagem que os EUA estão acusando o 5G da China. O poder oculto e ameaçador da tecnologia é mais no sentido de uma autoleitura dos acontecimentos do que um monitoramento na mão de fofoqueiros ou oportunistas.

Ignorando essa ameaça o que se nota nas ciências acadêmicas ocidentais é tratar o conhecedor da tecnologia como sinal de inteligência e por isso digno de confiança. Dessa maneira descuidando dos avisos do I Ching. O povo chinês deveria ser bastante estudado para se verificar a linha de raciocínio que culminou em sua avançada doutrina e em contraste a essa análise estabelecer porque nenhuma outra cultura geral alcançou tamanha percepção.

Devemos nos unir globalmente em torno dessa apuração. Utilizando a expressão de Nietzsche, fazer a genealogia do I Ching e partir dela traçar a genealogia das demais culturas ignorantes nas tramas da tecnologia. Precisamos, assim esclarecer de onde veio a visão da China a compreender melhor a realidade ardilosa que sustenta a alquimia, e lado outro a fraqueza das demais em culturas e creditar aos tecnólogos uma referência intelectual.  

Curiosamente não existe alquimia sem tecnologia e vice versa. Sem um não há o outro apesar de serem conceitos diversos. Tecnologia num parecer consistente levará em conta seu poder exploratório na medida que permite transformar algo abstrato em concreto. Já alquimia é o meio pelo qual o homem utiliza a tecnologia. Alquimia é a ponte entre o homem e aparente poder de realização aparentemente ilimitado.

No entanto, ainda que essa explicação soe bastante sofisticada na prática é pouco utilitária. Poder de realização é algo muito duvidoso quando não azarento. Mais importante do que ser capaz de realizar algo é saber se aquilo realmente será de boa aplicação. Fazer só para mostrar se é capaz não tem se mostrado uma boa atitude ao longo de toda atividade humana.

O fato inequívoco é que tudo na alquimia implica em sedução, notadamente sexual, em última análise. Somos treinados desde que nascemos para sermos enganadores ou enganados reciprocamente nessa atividade. O trabalho em empresas, no militarismo, no serviço público, toda a sociedade dita civilizada gira em torno de um status que sirva como moeda de troca a alguma atividade sexual pautada por enganação. Então se a alquimia é o instrumento entre o homem e sua vontade, só podemos concluir que a natureza da espécie humana é de predadores sexuais.

Por isso que quem pensa fora da caixa é comumente atacado. Trata-se da mitologia da submissão reinante no planeta Terra. Enquanto se está no carrossel da oposição sexual, inicialmente macho face fêmea, todos devem cantarolar a música da venalidade nesse sentido.

E esse giro coletivo é a temática de fundo tanto do Mito do Paraíso quanto de Pandora. Senão vejamos, Adão e Eva assim como Pandora viviam cerceados de tranquilidade. Mas a curiosidade levou ao apocalipse. Porém a indagação “extremely” sobre esses mitos é: Porque descobrir o funcionamento periférico ao cotidiano implica num apocalipse que os joga numa vivência desgraçada?

Sim, a resposta a isso está diretamente relacionada a enganação na alquimia para viabilizar o carrossel sexual. Na floresta não existe nada oculto que se descoberto gerará desgraça. Já na civilização parece as pessoas que se dedicam a problematizar questões periféricas acabam por se ver na mesma desgraça de Pandora, após ela abrir o vaso.

E o conteúdo esse vaso é o que o I Ching já milenarmente previu como as armadilhas da tecnologia. O povo chinês foi muito preciso nesse estudo. Acertou que não há como negar a tecnologia. Não há como todo o planeta retroceder ao estágio tribal do Curupira. Daí, a maneira de lidar com isso é primeiro aceitar que o uso da tecnologia nos sujeita a armadilhas. E após essa aceitação criar normas de conduta que viabilizem o uso da tecnologia sem se afogar em seu mal uso.

É essa a proposta do I Ching !

Já a proposta do “american way of life[8]” é esgotar os recursos da tecnologia.

É impossível saber onde o planeta chegará liderado pela cultura chinesa, inclusive porque os próprios mandarins dizem que o I Ching não pode garantir sucesso no máximo tenta proteger, impor escudo. Já se o planeta se unificar sob uma liderança que não trabalhe com a hipótese das armadilhas ocultas na tecnologia chegaremos ao apocalipse: veremos onde não podemos ver agora e pode ser que esse novel panorama seja bem pior que o atual.

No mais, a cultura da submissão nada mais é que reflexo de um componente presente no uso da tecnologia. Por isso ela está ativa em todas civilizações onde há alquimia, inclusive a China. Quanto mais tecnologia, mas se oferece hierarquia.

Ante o exposto, parece que o planeta ainda não está apto a uma unificação, estando adequadas à realidade atual posturas como Trump e Bolsonaro que lutam pelo nacionalismo. Quanto a China parece ser a pátria com a cultura mais avançada e por isso deve servir de modelo em vários aspectos, mas sua estrutura social consideravelmente vertical sugere que ainda falta algo a lhe atribuir discernimento a liderar o planeta.

Certo é que o ser humano somente estará apto a viver como povo único, integrado e pleno do planeta quando não mais precisar de líderes. E, pela suposta pandemia global de 2020 fica evidente que estamos longe disso.

  Obedecer a ordens cegamente ou as fazendo visando auferir alguma vantagem futuramente denota carência de orientação. E a sofrência por essa necessidade deixa vácuo a ser preenchido pelas armadilhas da tecnologia. 

Consequentemente, a ONU presidir o planeta é um ideal ainda distante.

                         

5.   Conclusão

Da parte que nos cabe como humanidade se deus quiser se emancipar[9] de seu “cativeiro” que envie um robusto asteroide para dar cabo do Planeta. Mas, descartada essa hipótese, não soa interessante emancipação divina se tivermos que destruir o Planeta ao longo do nosso processo civilizatório ou supostamente evolutivo.

Ao que parece a mitologia de Atená dotada de alta tecnologia e influenciando as várias culturas levará a destruição do Planeta. Já se a humanidade respeitar a visão do Curupira poderemos conviver senão harmonicamente ao menos sem ódios mesmo depois do ano de 2020 sufragado pela suposta pandemia alardeada pelo tentáculo da ONU conhecido como OMS.

Afinal de contas se somos todos criaturas porque direcionaríamos nosso ódio a quem não pode resolver o problema.[10] Se alguns escritos milenares estiverem corretamente interpretados no sentido que a tecnologia[11] nos foi trazida por serem divinos, sejam eles de outro planeta ou transcendentais, devemos ao menos duvidar se toda essa suposta benesse que a alquimia proporciona possa ser como o cavalo de Tróia ou algum tipo de baleia de Jonas[12].



[1] O Poder do Mito. Joseph Campbell. Editora Palas Athena. Página 34. Existe uma polêmica se a Muralha da China pode ser vista da Lua ou não, mas o entendimento prevalecente é que não a olho nu. A olho nu não há registro de nenhuma construção visível a quem estiver fora da órbita imediata do Planeta.

[2] Por reação em cadeia se entende tanto aquela do efeito dominó quanto de uma segregação como a cadeia ou presídio. Seja no primeiro caso ou no segundo se perde o contato com a fonte. No caso do dominó o último não teve qualquer contato com a causa, o primeiro dominó. E, no segundo caso, o encarcerado também vive alienado dos acontecimentos externos a cadeia.

[3] Toma num sentido de afetação, fazendo parte da alteridade do caçador conforme expressão da psicologia analítica.

[4] Apesar do conhecimento popular brasileiro referir a uma caixa a melhor tradução da mitologia grega é vaso.

[5] Há grande polêmica social sobre o ato de crivar julgamento. Em um lado, conotação elevada, se afirma que o ato de julgar é nobre e o julgador sábio; já do outro lado, conotação negativa, julga quem não consegue organizar a própria vida a assim se mete na vida alheia, ideia derivada da crítica “quem não sabe fazer ensina”.

[6] Nesse Mito um irmão só vê o passado e o outro só o futuro.

[7] O movimento feminazi entende suposta superioridade face o homem. Ainda que na Grécia antiga a sociedade fosse patriarcal nada impede que as feminazis da época, mesmo sem o rótulo aglutinativo moderno, acreditassem que não lhes davam os mesmos direitos que homens justamente por não reconhecer seu valor e por retaliação a isso a retirada alguns atributos civis.

[8] Apesar dessa frase ser comum nos EUA não se está fazendo referência somente a esse país.

[9] Parafraseando o Mito da Queda transcrito no capítulo 2 quando Isabela Fernandes sugere que a suposta vantagem da perda de ignorância do casal teve como vantagem se livrar do limitado cenário paradisíaco, aparentemente por necessitar de especial sustentação de Deus.

[10] Mesmo se nossa realidade for fractal como defendem alguns físicos ainda assim de nada adiantaria “culpar” qualquer humano ou a humanidade como um todo, pois a fractalidade resultará em ultima análise a uma responsabilidade individual plena.

[11] Há vários estudos de mitólogos nesse sentido e uma reportagem do canal History defendendo que alienígenas estiveram no planeta não só para nos passar a tecnologia, e também intervindo na genética humana. Provável a “doação” e a intervenção sejam duas faces da mesma moeda.

[12] Cavalo de Troia é a famosa estória grega de um presente que esconde uma porta para invasão. Já Jonas e a Baleia metaforiza a ideia queinteligência superior pode nos impor sua percepção.