Macumba

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segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Metrô


EXMO JUIZ DA MM    VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO DE JANEIRO









Felipe Fo, natural do Rio de Janeiro, brasileiro, solteiro, residente a rua Ailton Henrique da Costa 151, bl. 02, 807, Recreio, 22795-290, RioRJ, felipesfontes@hotmail.com, Servidor Público Federal, CPF 69696969 Titulo TRE/RJ 06969696969, apresenta, através de sua advogada infra firmada, AÇÃO POPULAR em face de INVEPAR SA, com sede na Av. Almirante Barroso 52, trigésimo andar, Centro, Rio de Janeiro/RJ, CEP 20.031-000, pelo adiante relatado.



        Onde já se viu isso!?! O clube da Luluzinha sem o clube do Bolinha...  

      

DO POLO PASSIVO

         O Metrô é hoje uma marca operada por um pool, Invepar, sendo uma concessão de serviço público. E, o vagão exclusivo feminino teve como causa a lei abaixo transcrita, de autoria da Governadora Rosinha Garotinho, posteriormente alterada por iniciativa da ALERJ, para impor multa.

No entanto, o pedido da presente ação popular não tem a pretensão de causar descumprimento a lei estadual. Pelo contrário, a complementa!

Isto porque ao vagão feminino ter sua plena validade em consonância com o texto Constitucional, não pode comprometer os anseios a quem ficou de fora do benefício. Vale dizer, em última análise, a mais fundamental função do judiciário dinamiza a promoção de debate social das medidas eventualmente açodadas, tanto de cidadãos comuns quanto de autoridades públicas. E, é isso que o autor vai mostrar ao MM Juízo nessa ação: as melhores teorias jurídicas e psicológicas abraçam o artigo quinto, I, da Constituição quando percebem homens e mulheres em mesmas condições de direitos profissionais e políticos. Nessa perspectiva a sociedade carioca há de aplaudir o vagão de mulheres para conversarem entre si, desde que o mesmo cenário seja contemplado a seus pares. Vale aqui um adendo para lembrar que em países “machistas” há casos de mulheres que não podem conversar.

Portanto, não há a necessidade de chamar a ALERJ ou o governador ao feito para defenderem a lei, posto que não há impugnação a mesma. Pelo contrário, o autor intende demonstrar ao juízo que a lei é boa ideia ainda que não contemple o contexto completo a que se destina, conserto esse que ora requer seja implementado pelo digníssimo judiciário carioca.

Nessa esteira quem deve responder pela omissão é a INVEPAR, pois é ela quem tem a administração do Metrô e por isso capacidade de criar vagão masculino. Trata-se de suplica judicial a garantir que ambas as faces da mesma moeda sejam lembradas. Lado outro, como pode haver interesse político da ALERJ em razão da importância do tema, o autor não se opõe a que eles se manifestem ao juízo no feito, não para defender a lei estadual ante ausência de impugnação a mesma, mas para se inteirarem de um assunto que lhes interessa: a efetiva validade da medida quando estudada a luz da Constituição, nos termos da pirâmide de Kelsen, e também frente a estudos da ONU e da psicologia analítica.

Ressalto, ainda, essa ação há de tramitar na vara de fazenda pública, conforme artigo sexto da lei da ação popular.

Abaixo inteiro teor da lei estadual 4733 devidamente atualizada, onde se constata que a destinação de vagão masculino em nada “incomoda” a lei estadual:



DISPÕE SOBRE A DESTINAÇÃO DE ESPAÇOS EXCLUSIVOS PARA MULHERES NOS SISTEMAS FERROVIÁRIO E METROVIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

A Governadora do Estado do Rio de Janeiro,

Faço saber que a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º - As empresas que administram o sistema ferroviário e metroviário no Estado do Rio de Janeiro ficam obrigadas a destinarem vagões exclusivamente para mulheres nos horários de pico matutino e vespertino.

§ 1º - Para efeito da presente Lei, entende-se como horário de pico matutino o intervalo entre 6h e 9h e vespertino o intervalo entre 17h e 20h.

§ 2º - Os vagões a serem destinados para o transporte exclusivo de mulheres poderão ser destacados entre os que integram a composição dimensionada para o fluxo de passageiros nos referidos horários de pico, ou adicionados à composição, a critério da concessionária.

§ 3º - Nos vagões que não são de uso exclusivo das mulheres poderá haver uso misto.

§ 4º - Excetuam-se os sábados, domingos e feriados do previsto no artigo 1º da presente Lei.

Art. 2º - As empresas terão 30 (trinta) dias para se adequar a presente Lei.

Art. 3º - O não cumprimento do disposto no caput do art. 1º, implicará no pagamento de multa de 150 (cento e cinqüenta) UFIR/RJ.

Parágrafo único – Se a irregularidade não for sanada no prazo de 30 (trinta) dias após a notificação pelo órgão responsável pela fiscalização, será aplicada multa diária de 50 (cinqüenta) UFIR/RJ.

(Artigo acrescentado pela Lei Nº 7250 DE 04/04/2016):

Art. 3º-A Compete às empresas responsáveis pela administração do sistema ferroviário e metroviário a adoção das seguintes medidas:

I - campanhas publicitárias educativas;

II - gravação de imagens das infrações;

III - identificação do infrator, sempre que possível.

(Artigo acrescentado pela Lei Nº 7250 DE 04/04/2016):

Art. 3º-B O descumprimento do disposto nos incisos I a III, do art. 3º A desta Lei, poderá acarretar às concessionárias as seguintes sanções:

I - advertência por escrito;

II - multa, no valor de 5.000 UFIR-RJ (cinco mil Unidades Fiscais do Estado do Rio de Janeiro);

III - multa, no valor de 10.000 UFIR-RJ (dez mil Unidades Fiscais do Estado do Rio de Janeiro), a partir da terceira ocorrência.

(Artigo acrescentado pela Lei Nº 7250 DE 04/04/2016):

Art. 3º-C O ingresso e permanência em vagão exclusivo de mulheres, nos horários previstos no art. 1º, § 1º desta Lei, sujeitará o infrator ao pagamento de multa no valor de 57,90 UFIR-RJ a 361,37 UFIR-RJ.

Parágrafo único. Recusando-se o infrator a se retirar do vagão exclusivo para mulheres de que trata esta Lei, as empresas concessionárias deverão identificá-lo sempre que possível, inclusive solicitando o auxílio da força policial para a condução à delegacia de polícia, caso necessário, e encaminhar, em qualquer hipótese, as imagens gravadas correspondentes ao órgão fiscalizador.

Art. 3º-D O Poder Executivo regulamentará a presente Lei. (Artigo acrescentado pela Lei Nº 7250 DE 04/04/2016).

Art. 4º - Esta Lei entra em vigor na data e sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, em 23 de março de 2006.

ROSINHA GAROTINHO
Governadora





DA NECESSIDADE E RAZOABILIDADE DO CUIDADO LIMINAR



O ímpeto em pleitear a presente ação se originou em meados do mês de setembro de 2017 quando o autor estava distraidamente no vagão exclusivo e foi rudemente advertido por fiscal: “Esse é vagão feminino! ”

Ao que parece o vagão feminino é um conforto a seus usuários, notadamente porque em momentos de picos ele tende a ficar mais vazio que os demais. Além disso outras causas para a segregação seriam conversas somente de mulheres, ou vontade de ficar próximo somente de pessoas do mesmo gênero. Todas essas causas valem também aos homens, ou seja, os motivos que justificam o feminino também valem aos homens.

Daí, se há entendimento de conforto adicional às mulheres no vagão exclusivo, que se adeque as leis de igualdade do pacto social brasileiro a garantir o mesmo benefício ao gênero que hoje se encontra excluído, qual seja, o masculino. Em outras palavras, o Metrô é um transporte absolutamente público, central a capital do Rio de Janeiro e por isso não cabe a imposição de regras que contrariem a impessoalidade social. Conversar entre mulheres, evitar paqueras vindas de homem ou até a vantagem eventual de vagões mais vazios são benefícios a que aos homens também se aplicam.



DA TUTELA PROVISÓRIA FUNDADA EM EVIDÊNCIA – ARTIGO 294 CPC



         Requer a concessão de liminar fundada em evidência posto o pedido não demandar qualquer produção de prova, ou seja, a questão posta em juízo envolve somente conhecimentos jurídicos. A isso acresça-se que no presente momento só existe o vagão feminino estando o Metrô em pleno funcionamento, gerando dano permanente a autoimagem masculina como “único banido”.



DOS ASPECTOS JURÍDICOS

        

Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.

         O primeiro inciso do artigo quinto explicitamente aborda o tema. Transporte imprescindível à cidade sem qualquer tipo de concorrência não pode ignorar a igualdade. Onde há concorrência pode haver diferenciações, aí o cidadão caso não se senta bem ante os procedimentos que não utilize o serviço.

         Já o Metrô é um transporte único, sem qualquer tipo de concorrência. Poder de escolha existe num taxi onde o usuário pode pegar outro a qualquer instante. Ainda que o cidadão carioca não precise do metrô para ir de São Conrado a Barra, pois pode pegar ônibus ou carro, ele não tem opção as vantagens do Metrô, como ausência de engarrafamento. Nesse caso terá que pegar o trem em que somente mulheres possuem vagão exclusivo, o que atenta contra o senso comum leigo e afronta a Constituição.

         Na busca da exaustão jurídica do assunto vale transcrever uma obra imprescindível ao eficiente empreendedor da Legislação, Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, originalmente escrita em 1924:

Serviço indireto presta, entretanto, a corrente ultra adiantada com a sua crítica panfletária e incisiva; coroa a obra da maioria histórico-evolutiva na repulsa da exegese meramente lógica ou dogmática dos repositórios de normas, e no clamor para que se equilatem e equilibrem os interesses legítimos...(17 edição, Editora Forense, página 82).

Essa área de interpretação cujo título foi extraído a transcrição feita, a que o autor chama de contra legem, é a semente das teorias ditas inclusivas ou afirmativas atuais, a qual o sistema de cotas universitária, reserva de vagas em hospitais ou a exclusividade de vagão feminino no Metrô são exemplos.

Efetivamente pensar o direito como meio de melhorar a sociedade está entre a atribuição dos operadores da lei. E, na virada do século houve um pico no debate das ações afirmativas, daí o aplauso do saudoso autor quanto a utilidade dessa vanguarda, mas seguida da advertência: “para que se equilatem e equilibrem os interesses legítimos”.

Existem vários motivos para uma conversa só de mulheres, assim como para uma conversa só de homens. Quanto ao conforto extra pela exclusividade do vagão, principalmente em horários de pico onde é comum ficar mais vazio, tal benefício também é querido por homens, e não há nada que justifique uma proteção a transporte lotado somente para mulheres. Condutas agressivas podem ocorrer tanto em vagão cheio ou vazio. Aliás, tais acontecimentos indesejáveis obviamente ocorrem mais nos vagões vazios, por isso qualquer causa pretensamente justificadora que se oponha a favor da exclusividade feminina também há de beneficiar o sexo parelar.

Certo é que todos os trens do Metrô estão organizados com vagão exclusivo destinado unicamente as mulheres, ou seja, ausência absoluta de opção ao homem que não concorde com esse cuidado dirigido somente às mulheres, sendo, portanto, fato público e notório cuja produção de prova é despicienda.

Outrossim, oportuno abordar doutrina em direito comparado. Flavia Piovesan ao comentar a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher pondera que o objetivo da ONU nesse campo é promover igualdade de condições notadamente no mercado de trabalho e na participação política. Já quanto as ações afirmativas esclarece que são compensatórias e por isso devem ser temporárias e enquanto implementadas devem: “acelerar o processo de igualização de status entre homens e mulheres, as ações afirmativas cessarão quando o objetivo for alcançado.” (página 88, Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional).

         Analisando sistemicamente o relatado pela reconhecida autora fica evidente o cenário que separar vagão somente a um sexo não atende nem ao objetivo da ONU de promover igualdade nem a eventual compensação em ação afirmativa, na medida que o vagão feminino não está de maneira alguma contribuindo a inserção da mulher como agente laborativo/empresarial ou politico.

         Inversamente, tal vagão soa como um “especial carinho” ao “sexo frágil”. Nada tem de promoção a igualdade seja como instrumento compensatório/temporário seja como trilha em projeto social visando plena paridade nas condições sexuais.

         Enfim, juridicamente, é explicito tanto na Constituição quanto na doutrina que vagão exclusivo só para mulheres é um desvirtuamento grave na condução de políticas urbanas que clamando por ação afirmativa, não atende a esse propósito; mas, pior ainda, atende ao oposto: realçar a mulher como sexo frágil que carece de assistência governamental para poder se distanciar do outro. Compreendendo o panorama chega a parecer mais uma piada ao despontar como atitude desastrosa de líderes brasileiros dos últimos anos.

         Lado outro, se esse digno juízo atender a tese ora veiculada e conceder a cidade carioca o vagão exclusivo masculino, o desvirtuamento se transforma num convívio social harmônico, pois respeita-se a igualdade e fica garantida a promoção da diversidade, pois conversar somente entre iguais deixa de ser privilégio de um sexo para ser opção a todos, tudo isso em favor de um transporte plural onde cada grupo pode buscar seu caminho.

Outrossim, para se esgotar o tema vale também buscar especialistas fora do acadêmico jurídico. E, até onde se pesquisou o assunto, essa questão foi investigada cientificamente pela primeira vez na psicologia analítica, fundada por Carl Jung. Daí vale a citação do livro ANIMUS E ANIMA NOS CONTOS DE FADA posto que a divisão natural entre sexos é o principal foco nessa linha de pesquisa derivada da medicina:

Quando o fluxo de energia psíquica é bloqueado, surgem infinitas disputas filosóficas e teológicas; ou, na vida acadêmica, dissertações tolas sobre questões sem importância, ao passo que assuntos vitais são ignorados. (Marie-Louise Von Franz, página 33, Editora Verus).

Essa citação suscita a problemática sob os dois ângulos relevantes, quais sejam, o transporte coletivo, onde somente um gênero tem privilégios a consequência nefasta é bloquear a energia do gênero esquecido, qual seja, o homem como ser da polis exonerado do mesmo direito; já o outro ângulo, é olvidar o panorama em andamento em que o Metrô coloca mulheres como seres especiais necessitando de conforto diferenciado ou proteção particularizada. Trata-se de retrocesso na promoção de uma sociedade sadia sem pisanteios de um grupo sobre o outro, na medida em que o homem é marginalizado dessa possibilidade.

Em suma, privilegiar só “uma das faces da moeda” é ignorar o assunto mais vital das relações humanas: equilíbrio entre homens e mulheres. Ao mesmo tempo que incentiva a ideia do sexo frágil feminino, o que causa eclosão da ira de homens em terem autoimagem “pintada” de agressividade, falta de educação e até exclusão das faculdades inerentes a cidadania por não receber a mesma atenção em um transporte público central e único ao município.

Certamente as queixas sobre desentendimentos por conta do vagão feminino que demandaram a discussão sobre multas que desaguou na alteração a lei da Governadora Rosinha serão reduzidas fortemente quando implementado o vagão masculino, tanto porque os homens não se sentirão excluídos e ainda porquanto “extremistas feministas” perderão seu palco, o que favorecerá os custos do Metrô pois diminuirá a necessidade de fiscais.



DO PEDIDO



         Requer a confirmação de liminar eventualmente concedida para determinar em caráter definitivo que a INVEPAR destine vagão exclusivamente masculino nos mesmos moldes, quantidade e horário, que o faz ao feminino.

         Requer a citação oportunizando a contestação e em caso contrário os efeitos da revelia.

Dá-se a causa o valor de R$ 1.000,00, para os efeitos legais.

         Intenta o autor todos os meios de prova aceitos judicialmente.

        

Rio de Janeiro, 04 de outubro de 2017.



Mando pra Cacete

OAB/RJ